sexta-feira, 27 de maio de 2011

Isso é Nação

Um domingo qualquer. Era um dia frio, sem chuva. Seria um dia chato, não fosse o Maracanã lotado e a expectativa de um título.

Ele não era fanático, sequer tinha visto o estádio lotado na vida, até então. Tinha 13 anos e torcia, timidamente, para o Palmeiras, apesar de morar no RJ. Naquele domingo seu pai o levou na final. De bandeira, camisa e ingresso na mão, chegou assustado com a multidão. Entrou faltando 15 minutos pra começar e, quando olhou em volta, disse: “Pai, quantas pessoas tem aqui?!?”. - Muitas, filho… uma nação inteira, disse o pai.

Aquela multidão explodiu em faixas, bandeiras e papel picado minutos depois. O garotinho se encolheu com medo e sentou. Com 1 minuto de jogo a torcida levantou e não deixou que o guri visse mais nada. Ele ouvia, sentia, mas não assistia. Seu pai, rubro-negro fanático, não tinha muita esperança de que seu pivete palmeirense um dia se envolvesse com futebol. Jamais mostrou grande interesse, e só torcia porque tinha um amigo que era palmeiras. O Flamengo saiu ganhando, mas não bastava. Tinha que ser com 2 gols de diferença, ou nada. Seu pai explicou que “faltava um”, e o garotinho não entendeu. Afinal… vitória não é vitória de qualquer jeito? Sofreu um gol, e ele não tirou sarro do pai como sempre fazia. Ficou triste, como que contagiado pela multidão. O outro lado, 40% do estádio apenas, fazia barulho, e ele ouvia o silencio da nação a sua volta. Segundo ele, o silencio mais dolorido que já escutou na vida. O Flamengo fez o segundo, e o garotinho, se envolvendo com o jogo, vibrou. Pulou no colo do seu pai e o abraçou como se fosse um legítimo urubuzinho.

Não era, ainda. A torcida começou a cantar o hino, que ele sabia de cor de tanto ouvir o pai cantar. Pela primeira vez, cantou num estádio, e fez parte da nação. A angustia de milhares não passou em branco. Em mais alguns minutos o garotinho suava e já rezava de mãos grudadas ao peito. O Flamengo virou, mas não bastava. 40 minutos do segundo tempo. Mesmo com 2×1 no Placar, a nação ouvia gozações do outro lado. Ele não entendia, e fez o pai explicar, mesmo num momento dramático do jogo. Atencioso, o pai sentou e contou pro garoto que o Flamengo precisava ter 2 gols de vantagem, porque a vitória por um gol empataria a soma de 2 jogos, e o empate era do rival. Ele não entendeu bem, mas simplificou em sua cabeça: “Mais um e ganharemos”. Opa… “ganharemos”? Ele não era palmeirense?

E então, aos 43 minutos, onde alguns já se mexiam na direção da saída, uma falta do meio da rua. Seu pai vibrou e ele questionou: “O que foi? Foi pênalti!? “ - Quase isso, filho!! Dali pro Pet é pênalti!!, profetizou o pai, ignorando a distancia da falta. A cobrança… o silencio eterno de 1 segundo e a explosão. Gol do Flamengo! Petkovic! E seu pai o abraça como nunca abraçou em toda sua vida. Pula, joga o garoto pra cima, beija, chora… O garotinho, numa mistura de susto com euforia, olha em volta e, de braços abertos, comemora em silencio um gol que não era dele. Sem razão, ele chora. E chorando, abraça o pai que, preocupado, rompe a alegria e pergunta: O que foi? O que foi? Se machucou? - Não… Eu to feliz, pai! Sem mais palavras, o pai sentou e abraçado ao garotinho deu um abraço de tricampeão.

O jogo acabou, e os dois continuaram abraçados. A festa rolando, os dois assistindo a tudo aquilo emocionados, o garotinho absolutamente embasbacado com a cena, já que nunca havia visitado um estádio lotado, muito menos uma decisão. O pai olhava pro campo e pro filho, porque sabia que, talvez, aquele fosse seu único momento na vida onde teria a imagem de seu garoto comemorando um titulo do time dele. E chorava, sem vergonha nenhuma de quem estivesse em volta. O menino foi embora pensativo, eufórico. Em casa, contou pra mãe com uma empolgação incomum sobre tudo que viveu naquela tarde. E não falava do jogo, apenas da torcida. Iludido por uma frase, contou pra mãe: - Aí, no finalzinho, teve um pênalti! E o Flamengo fez o gol… - Não filho… não foi pênalti! Foi de falta. - Mas você disse que foi pênalti… - Era modo de falar…. hahahahahah - Então, mãe… aí, o cara fez o gol e a gente foi campeão!!! 

Pronto. Aquele “a gente” fez o pai parar de colocar cerveja no copo, virar a cabeça lentamente e perguntar, com medo da resposta: - A gente, filho? (silencio…) - É pai! O Mengão!!!!! Emocionado, o pai abraçou o garoto e não falou nada. Ali, seu maior sonho virava realidade. A mãe entendeu, deixou os dois na cozinha e saiu de fininho, enquanto o pai começava a contar de uma outra final que viveu em mil novecentos e bolinha, com toda a atenção do novo rubro-negro. Hoje o garoto tem 21, completados há alguns dias. Quando seu pai perguntou o que ele queria de presente este ano, a resposta foi essa: - Dois ingressos, uma bandeira, a camisa nova e ver você chorando igual aquele dia. E há quem diga que “futebol é bobagem”… 


Saudações Rubro-Negras!

Por
Lucas Mello (apud, Renato Catatau)

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